quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Balde de ácido no estômago e pontadas no peito.



Acordei de madrugada na escuridão de meu quarto e ouvi o silêncio pleno. Aquilo foi a coisa mais bonita que alguém já disse para mim até hoje. Precisei interromper abrindo os olhos e colocando o pé para fora da cama. Mais um dia de serviço para cumprir. Eu trabalho como 'momento da vida humana'. Sou aquele momento em que o cara encontra com sua namorada, olha ela nos olhos e percebe que ela é a garota mais linda do mundo e que quer passar o resto dos dias junto com ela. Venho logo antes do momento em que ela conta para ele que está grávida do seu melhor amigo e que acabou tudo entre eles.

Eu queria ser agente secreto quando pequeno, mas nasci com um câncer terminal, então precisei escolher alguma profissão que envolvesse serviços rápidos, afinal, poderia morrer a qualquer momento. Estava entre trabalhar como um relâmpago, como o sucesso de uma celebridade instantânea ou como uma ejaculação precoce, mas de última hora o departamento das 'pequenas ilusões humanas' abriu vagas, e me candidatei ao trabalho de momento em que uma pessoa dá a primeira mordida em uma barra de chocolate. Acabei caindo neste meu serviço atual, e fico até feliz, melhor trazer a felicidade estando ligado a uma paixão por outro alguém do que ligado ao estômago de uma pessoa com problemas de excesso de comida e nervosismo. Se bem que dizem que chocolate também pode vir relacionado a uma paixão, mas no caso eu não viria junto com um sorriso, e mamãe sempre disse que eu era otimista.

Meu trabalho é bom, não tenho nada a reclamar, tirando que cada vez menos tenho serviço. As pessoas esqueceram o que é se doar a um momento bom com outras pessoas, e eu não falo de uma orgia, isso está fora do meu departamento. Só fico triste mesmo que já sinto os resquícios de meu fim, tudo o que é bom dura pouco, e meu câncer não tem cura. Deverão achar alguém que vá me substituir, e eu estava traumatizado com esta possibilidade até agora há pouco, mas hoje não, acordei ouvindo os sons do silêncio e pela primeira vez na vida senti a sinceridade que vem do nada e não promete nada também. Vou indo então para o trabalho, foi bom contar um pouco de minha vida, e não se esqueçam que a qualquer momento eu posso aparecer para vocês, só não se animem demais, minha vida é curta, e posso vir acompanhado de momentos não tão agradáveis, isso só vai depender de vocês. Como? Só posso dar uma dica, nunca usem meias azuis se estiverem viajando para a França.


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